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O psicodélico mundo de Serguei

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Após muitas risadas ao telefone, finalmente conheci o roqueiro Serguei pessoalmente. Tenho feito um levantamento árduo de sua história em livros, jornais e revistas, enquanto meu amigo Paulo Andel assiste a entrevistas e documentários, redigindo e registrando detalhes que possam fazer diferença na biografia mais do que autorizada do artista.

Saí de São Paulo ainda de madrugada em direção ao Rio de Janeiro. Acompanhado da Janaína, encontrei o Andel e o Silvio Almeida, responsável por documentar o encontro, no Aeroporto Santos Dumont. Chegamos a Saquarema por volta do meio dia. Encontramos um transeunte e perguntamos onde era o Templo do Rock, a casa do Serguei.

– Aquela praga? É só entra aqui à esquerda, após a caixa d´água – brincou o morador da pacata cidade.

Esperava um local mais a esmo, mas fica realmente ao lado da rodoviária, de fácil acesso. Abrimos o portão, e os quatro cachorros que moram com o roqueiro estavam por lá se alimentando e nem deram bola para nossa presença. Serguei apareceu descalço, com uma camisa cinza de mangas compridas, um cordão com o símbolo da paz no pescoço e uma calça jeans. Pediu que aguardássemos um instante que ele precisava arrumar a casa. Era visível que havia acordado há pouco tempo. Voltou em menos de dez minutos, claro que não arrumou nada, deve ter escovados os dentes apenas, já que os cabelos ele não penteia, e voltou usando um cinto de tecido, cheio de estilo e totalmente psicodélico. Quando explicamos quem éramos, ele lamentou (e fez isso outras diversas vezes) o fato de não estar de barba feita, maquiado e usando suas lentes de contato azuis.

Serguei mostrou a casa enquanto eu analisava os recortes na parede, havia muito material por lá, imagens que não encontrei pela Internet. Muitos livros espalhados.  Todos eles, presentes dados por outras celebridades, como Ângela Maria e Erasmo Carlos. Ele guarda de tudo por lá, fotografias antigas, fitas em VHS, vinis e CDs. Além de bandeiras, canecas, pôsteres e tudo mais que envolve o universo do Rock N´ Roll. Perguntou um a um quem éramos, e questionou quem era a Janaína. Ao saber se tratar de minha namorada, disse que ela era bem bonita e pediu para tirar foto abraçado a ela. Após ser fotografado, me deu um beijo na testa e disse que o beijo era para que não batesse nele por isso, levando todos às gargalhadas.

Sentei ao sofá e começamos a conversar assuntos a esmo, enquanto Sílvio montava o equipamento para registrar a entrevista. Serguei criticava a situação atual do País, falava sobre uma matéria que assistiu de crianças pobres no Maranhão, aproveitando para falar dos seus tempos nos EUA e criticar o País, faz isso diversas vezes, sempre que toca no tema, ainda que depois peça desculpas, reflexo dos tempos de terror da ditadura militar:

– Pedi a Deus duas coisas, uma não envelhecer aqui, a outra não morrer aqui. A primeira ele não me atendeu, a segunda, por consequência, não vai atender também. Podiam ao menos levar meu corpo para ser enterrado em Nova Iorque – Disse com um sorriso no rosto.

A vida em Saquarema é simples, apesar de ter sido presenteado com dois anos de supermercado pela TV Record, após entrevista com o apresentador Gugu Liberato, a geladeira estava totalmente vazia. Bateram a porta e entregaram ao cantor uma quentinha para o almoço. De fome não morre, porque os moradores ajudam como podem a cuidar dele.  Compramos duas garrafas de Coca-Cola de dois litros a pedido dele, pois é sua bebida preferida. Por incrível que possa parecer, Serguei não bebe bebidas alcóolicas e não faz uso de entorpecentes. Nunca o fez.

Paramos o papo para que ele pudesse comer. Enquanto fotografavam a casa e arrumavam o equipamento, fiquei sentado a sua frente conversando, enquanto ele almoçava. Tentei tirar algumas dúvidas que tinha sobre sua vida, pra montar esse psicodélico quebra cabeças, mas o papo é sempre confuso. Ele costuma confundir datas, situações, e até o próprio parentesco. Para terminar, enquanto almoçava caiu no sono, sentado, bem a minha frente, como se tivesse desmaiado. Demorou uns minutos para acordar e disse ter ido dormir às cinco da manhã, pedindo desculpas por “apagar”. Era a primeira vez que via isso ao vivo, já que o vi dormindo do nada em entrevistas e muitos dos que entrevistei me contaram sobre esse hábito do roqueiro.

Após o almoço, com tudo pronto para a entrevista na sala, Serguei se levantou, lavou a louça e escovou os dentes para, em seguida me mostrar mais recortes e livros em seu quarto. Deitou na cama e começa a filosofar. Pronto, pegamos todo o material que estava na sala e levamos para o quarto para que a entrevista acontecesse por ali. Tentar seguir qualquer roteiro com ele é impossível. Nada com Serguei é previsível: o que ele vai dizer em frente às câmeras, o tema da entrevista e menos ainda se ficará acordado.

No meio da entrevista, enrolado a uma bandeira do Fluminense Football Club, voltou a criticar o Brasil, com exceção a São Paulo; Ele sempre defende que São Paulo carrega o Brasil nas costas e que deveria ter se separado do resto do País na Revolução Constitucionalista de 1932.

– As únicas coisas que prestam no Brasil é a minha família, o samba e claro, o Fluminense – Disse beijando a bandeira enrolada em seu corpo, pouco antes de apagar novamente durante a entrevista. Um momento hilário devidamente registrado para o documentário que faremos para divulgação de sua biografia.

Antes de irmos embora, cantou umas duas ou três canções em inglês. No repertório, Elvis Presley e Led Zeppelin, a plenos pulmões, chamando atenção de todos que passavam na rua, seja a pé ou de carro, parando para ver o Serguei cantando na entrada do Templo do Rock. Despediu-se agradecendo nossa presença e nos convidando para voltarmos assim que possível, entre beijos e abraços.

Mais cedo ou mais tarde, nós voltaremos mesmo, porque após esse dia incrível, ganhamos mais do que o convívio de um artista, mas também um querido amigo.

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Sobre Rodrigo Barros

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Empreendedor e escritor, Rodrigo Barros é bacharel em Biblioteconomia e em Sistemas de Informação, com pós-graduação em Gerência de Projetos e MBA em Gestão de Marketing. Fundador e editor chefe na Cartola Editora.

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