Kindle paperwhite: Prático como você

A saudade irritante…

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Pouca coisa poderia ser aproveitada na televisão. Já era madrugada, mais uma das muitas noites frias de São Paulo. Ele estava sem sono, foi à janela fumar um cigarro, olhava a noite escura e ouvia uma boa música. Respirava o ar gelado, com a sensação de que os pulmões congelavam, e de fato não havia o que lhe aquecesse, nem o café expresso que tomava. Usava um moletom cinza que contrastava com o cobertor laranja sobre a cama. A voz de Norah Jones na vitrola era a única companhia naquele instante.

A cidade, que quase sempre é cinza, estava negra. Pensava nessa coisa única de São Paulo, quase sempre mórbida, fria, com aquele ar estranho de que a cidade pulsa, não dorme, ainda que morta, como um vampiro a espreita na escuridão, vivo, atento, mas de fato morto.

Um rapaz passeava pela rua em sua bicicleta, carregava pães.  “O dia estava por amanhecer”, pensou. Quase tudo era silêncio, mas o sono não vinha, estava irritado demais para conseguir dormir. Pegou uma garrafa de conhaque, derramou um pouco na xícara de café quente. Precisava relaxar, a música ajudava, mas não trazia a paz que precisava.

Pensou em ler um livro, espairecer os pensamentos, focar em outra coisa que não fosse o que lhe atormentava naquela madrugada. Não conseguiu. As palavras se perdiam em meio aos sentimentos. Pegou um papel em branco e começou a rabiscar algumas palavras, precisava de algo para organizar as ideias, escrever alguma coisa que pudesse convencê-la a voltar.

A vida não era mais a mesma, a Cidade não lhe trazia mais a calma de outrora. Os mendigos nas ruas lhe irritavam, o trânsito, as buzinas, os congestionamentos. Até os casais andando de mãos dadas lhe irritavam. Mesmo quando o dia não estava cinza, o sol também não lhe trazia calma, a noite, a falta de sono, tudo lhe tirava a paciência.

Porque o que lhe atormentava era a saudade irritante. Aquela saudade que insistia em não deixa-lo sozinho. Bem diferente do que ela fez ao decidir partir.

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Sobre Rodrigo Barros

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Empreendedor e escritor, Rodrigo Barros é bacharel em Biblioteconomia e em Sistemas de Informação, com pós-graduação em Gerência de Projetos e MBA em Gestão de Marketing. Fundador e editor chefe na Cartola Editora.

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