Kindle paperwhite: Prático como você

O homem e o artista

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Eles se encontraram naquela manhã e rapidamente se reconheceram. Sem trocar uma única palavra, se olharam nos olhos e analisaram friamente um ao outro. O homem olhou o artista de cima a baixo, como se pudesse defini-lo em alguns segundos. Com o artista não foi diferente, também observou todas as características do homem. Eles eram bem diferentes, desde a maneira de se vestir, pensar, comportar e sonhar, isso fazia com que ambos estranhassem a presença do outro, sempre tão próxima.

O homem acordava todos os dias cedo, estudava bastante e estava sempre preocupado com todas as responsabilidades de um homem adulto. Procurava os melhores resultados e o reconhecimento de seus pares na empresa. Procurava ser sempre correto com sua família, com amigos e outros. Não bebia, estava sempre preocupado com horários, com o dinheiro que recebia e com as contas a pagar.

O artista raramente tinha pressa, costumava dormir muito tarde, a noite ajudava a criar, sua única preocupação era em escrever, compor e ler. Ele não estava preocupado em estudar em cursos formais, mas não parava de ler. Quanto mais lia, mais conhecimento absorvia e mais elementos recebia, para que pudesse criar, sejam novos contos, músicas ou poesias. Sempre que podia, bebia um pouco, o álcool também o ajudava no processo de criação.

Eles tinham dificuldades na convivência, como duas pessoas tão diferentes poderiam coexistir num mesmo ambiente? Sempre que o homem precisava dormir, o artista ficava acordando criando alguma coisa. Sempre que o artista tentava dormir, o homem acordava cedo para ir ao trabalho. Todas as vezes que saíam juntos, o artista queria beber um pouco pra relaxar, e o homem, por mais tenso que estivesse, precisava voltar pra casa ou para o trabalho, não poderia se dar ao luxo de perder tempo com amenidades e pequenos prazeres.

O homem era prático, calculava e executava, o artista era somente emoção, via arte em tudo. Até no amor eles eram opostos. O homem não acreditava no amor, não que não pudesse amar, ele amava, mas de forma fraternal, calma e tranquila, quase que calculada, não da maneira apaixonada e avassaladora que o artista costumava amar. O artista estava sempre apaixonado, e não somente pelas mulheres, era apaixonado por crianças, animais, por livros, cultura e tudo mais. O homem não, este era sério a maior parte do tempo, calculava os riscos e os custos de ter um filho, um cachorro e até mesmo o valor de um novo livro apenas para entretenimento.

O homem e o artista eram diferentes, e por isso não se entendiam. Um controlado demais, o outro exacerbado, um econômico, o outro esbanjador e assim eles conviviam a maior parte do tempo. Não brigavam muito, mas estavam sempre em conflito, uma “Guerra Fria”, calados, sabendo que um atrapalhava o outro, mas era preciso coexistir em um mesmo universo. Eram diferentes, mas havia a necessidade de aceitação, ainda que por muitas vezes um falasse mais alto que o outro. Em grande parte do tempo não se enxergavam, como eles estavam fazendo naquele instante.

Desistiram da autoanálise e saíram da frente do espelho, seguindo em sua coexistência, dentro de um mesmo e complexo ser.

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Sobre Rodrigo Barros

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Empreendedor e escritor, Rodrigo Barros é bacharel em Biblioteconomia e em Sistemas de Informação, com pós-graduação em Gerência de Projetos e MBA em Gestão de Marketing. Fundador e editor chefe na Cartola Editora.

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